segunda-feira, 28 de março de 2022

São Jorge: novas "deformações no solo" podem ser sinal de erupção. "É como a rolha de uma garrafa"

 São Jorge: novas "deformações no solo" podem ser sinal de erupção. "É como a rolha de uma garrafa"


Não se prevê, para já, nenhum sismo maior, nem nenhuma erupção "iminente", mas dados recolhidos no terreno começam a dar pistas aos especialistas

Foram detetadas "pequenas deformações no solo, que no início da semana não existiam", na zona da ilha de São Jorge "onde estão a ocorrer mais sismos". A revelação é feita à CNN Portugal por Nuno Dias, especialista em sismologia e professor no ISEL (Instituto Superior de Engenharia de Lisboa), e Pedro Terrinha, geólogo e investigador do IPMA.

Nuno Dias aponta que, nesta altura, a tendência dos sinais parece caminhar para “o lado da erupção”, mas ainda é cedo para ter a certeza. Os próximos dias serão determinantes.

São estas deformações no solo, juntamente com o mau tempo esperado na região para esta sexta-feira e sábado, que terão levado as autoridades a optar por retirar a população das fajãs do concelho das Velas, na ilha de São Jorge.

Localização de Velas na Ilha de S. Jorge

Pedro Terrinha confirmou à CNN Portugal que as equipas que estão “a monitorizar a deformação crustal encontraram alguma modificação no terreno”. Ou seja, foram detetadas “deformações localizadas numa zona específica da ilha, que é a zona onde estão a ocorrer mais sismos”, conclui. Mas ainda é cedo para saber ao certo o significado desta descoberta.

De resto, segundo Pedro Terrinha, o elevado nível de “sismicidade continua a acontecer, na mesma zona, com a mesma magnitude baixa e a mesma profundidade”. Nas últimas horas, não houve aumento da atividade sísmica, nem em quantidade, nem em intensidade.

Nuno Dias está a coordenar uma equipa no terreno, ligada ao Instituto D. Luís, que está "a instalar estações sísmicas temporárias". A chuva não está a facilitar a instalação das mesmas, mas já estão a recolher alguns dados e mais irão ser recolhidos.

O que significam estas fraturas nas rochas?

Que o magma que se movimenta por baixo da terra está a fazer pressão. “É como a rolha de uma garrafa. O gás faz pressão para a rolha saltar”, explica Nuno Dias.

No início da semana, não tinha sido detetada nenhuma alteração nos solos e agora a situação parece ter-se alterado ligeiramente. Todavia, Nuno Dias explica que as fraturas "não têm um sinal claro de magma” e estão ainda a grande profundidade, por isso, “o perigo não é iminente”.

Será possível prever o aumento do perigo?

Para tal, “é preciso juntar vários indicadores” e só “tudo conjugado” poderá dar lugar a um alerta.

“Quando se evolui para uma erupção, há uma altura em que a situação evolui mais rápido”, mas “nunca menos de um, dois dias ou algumas horas”. Facto que dará tempo às autoridades para lançar um alerta à população.

Por norma, “também poderá haver um sismo mais forte, que antecederá uma erupção”. Nunca “será de grande intensidade”, mas “em terra, um sismo de magnitude 4 já causa estragos”.

E quais são esses sinais?

“Uma maior atividade sísmica, com maior intensidade; mais e maiores deformações no solo, com sinal de magma e o aumento da emissão de gases”, explica este especialista. Nuno Dias acredita que as fraturas detetadas levaram as autoridades a pedir a retirada de alguma população e justifica: “Peca-se por excesso, mas é melhor” quando há vidas em risco.

“Os próximos dois/três dias” vão ser determinantes “para se perceber melhor para que lado a situação vai pender”, no entanto, a tendência dos sinais parece caminhar para “o lado da erupção”, assume este sismologista.

Mesmo assim, a natureza pode ser surpreendente, e é num instante que as certezas desaparecem. “Neste momento, os valores de emissão de gases estão no nível habitual”. Não houve aumento, por exemplo, “do CO2”, que seria um sinal de maior atividade vulcânica.

Este fenómeno sísmico é normal?

Segundo Nuno Dias, o que se está a passar “não é normal” e, desde domingo, que todos os especialistas da área estão a comunicar entre si. Todos querem enviar equipas e material, porque é importante estudar estes fenómenos. E ainda falta algumas equipas chegarem ao terreno.

Nuno Dias descreve a ilha de São Jorge "como um conjunto de pequenos vulcões que formam uma língua de terra”.

Esta região, dos Açores, está “numa junção tripla de placas”, o que a torna propícia a sismos. “É a junção da placa europeia, africana e americana”.

Microplaca dos Açores

Localização da Ilha de S. Jorge na Microplaca dos Açores

Apesar da região estar a viver uma situação semelhante ao que aconteceu em La Palma, nas Canárias, a sequência de eventos não tem de ser igual.

Pode uma erupção em São Jorge afetar as outras ilhas dos Açores?

“Sim”, diz Nuno Dias, “ao nível da ocorrência de sismos". "Poderá afetar mais ilhas, mas só a esse nível”. Claro que convém não esquecer que, depois, “a libertação de gases e cinzas”, consoante os ventos, também poderão produzir efeitos secundários.

Previsão de mau tempo

Esta sexta-feira (25/03), a chuva já se faz sentir na ilha e as previsões para sábado não são melhores. O tempo, conjugado com a crise sísmica, pode provocar desabamentos em São Jorge e, por isso, a população mais vulnerável foi aconselhada a sair.

Na verdade, os habitantes das fajãs do concelho das Velas, a área mais afetada, já estão a ser retirados, passando a ser proibido ir para aquelas zonas devido à crise sismovulcânica.

O que está a acontecer na Ilha de São Jorge é chamado pelos especialistas de “enxame de sismos”, um fenómeno semelhante, em alguns aspetos, ao que aconteceu em La Palma antes da erupção do vulcão.

Recorde-se que na passada quarta-feira (23/03), o CIVISA elevou o nível de alerta vulcânico na ilha de São Jorge para V4 (de um total de cinco), o que significa “possibilidade real de erupção”.

Também na quarta-feira, a Proteção Civil dos Açores ativou o Plano Regional de Emergência devido à elevada atividade sísmica que se regista em São Jorge desde sábado. Os planos de emergência municipais dos dois concelhos da ilha, Calheta e Velas, também já foram ativados.

Adaptado de https://cnnportugal.iol.pt/sismos/acores/sao-jorge-novas-deformacoes-no-solo-podem-ser-sinal-de-erupcao-e-como-a-rolha-de-uma-garrafa/20220325/623df1900cf2cc58e7ea8003


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Resposta à da Adivinha Geológica 4