Há cinco mortes confirmadas e cerca de 30 feridos. A polícia teme que não haja sobreviventes no grupo de turistas que estava na ilha no momento da erupção. O cair da noite e o fumo dificultaram as operações de socorro que recomeçaram logo ao amanhecer.
Cláudia Carvalho Silva, 9 de Dezembro de 2019, 7:46
Lusa/ Michael Schade
Um vulcão entrou em erupção na Nova Zelândia e “não há sinais de vida” do grupo que estava na ilha no momento, avança a polícia neozelandesa. Há cinco mortos confirmados e mais de 30 feridos entre as pessoas resgatadas, mas há ainda oito desaparecidos e a polícia avisa que não deverá haver sobreviventes.
O vulcão da ilha Branca (também conhecido como Whakaari) é um dos mais ativos do país. Durante algumas horas, as operações de resgate foram dificultadas pelo cair da noite e pela falta de visibilidade causada pelo fumo. A polícia neozelandesa – que chegou a ser auxiliada pelas forças militares – referiu que estava a ter dificuldades em aceder à ilha por causa das condições inóspitas causadas pela erupção.
Por volta das 6h30 (17h30 em Portugal), a polícia avançou que não foram encontrados mais sobreviventes durante a noite e que o número de desaparecidos se mantém. Cerca de três de dezenas de pessoas estão ainda a ser tratadas em sete hospitais da região e três já tiveram alta do Hospital de Whakatane.
A primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern, disse que na altura da erupção estavam 47 pessoas na ilha, informação também avançada pela polícia local. Entre as vítimas mortais e desaparecidos estão cidadãos da Nova Zelândia, Austrália, Estados Unidos, Reino Unido, China e Malásia. Uma das vítimas que não resistiu aos ferimentos foi já identificada como um dos guias do grupo que estava na ilha no momento. A companhia de cruzeiros para a qual trabalhava já disponibilizou uma linha telefónica para que os familiares das vítimas possam obter mais informações.
O primeiro-ministro australiano, Scott Morrison, disse que três das cinco vítimas mortais confirmadas são australianas. Um grupo de 24 cidadãos da Austrália com idades compreendidas entre os 17 e os 72 anos visitaram a ilha Branca esta segunda-feira. “Este é um dia muito, muito difícil”, disse Morrison depois de visitar a ilha, acrescentando que 13 cidadãos estão ainda hospitalizados e que alguns estavam ainda desaparecidos.
Jacinda Ardern disse à imprensa que um dos pilotos passou cerca de 45 minutos a sobrevoar o vulcão esta manhã e que “não havia sinal de vida”; elogiou também os esforços dos socorristas, incluindo dos pilotos dos vários helicópteros que resgataram pessoas da ilha. “Gostaríamos de reconhecer os esforços que eles fizeram para garantir que todos os que pudessem ser evacuados o fossem”, disse Ardern.
Um grupo de turistas foi visto a aproximar-se da cratera do vulcão pouco tempo antes da erupção (às 14h locais, 1h em Portugal). A polícia diz que 23 pessoas foram resgatadas (cinco delas morreram) e que é “provável” que o número de mortos venha a aumentar. “A polícia acredita que quem quer que pudesse ter sido retirado da ilha com vida foi resgatado na altura da evacuação”, referem as autoridades, que têm sobrevoado a área circundante.
A erupção provocou uma coluna densa de fumo com centenas de metros de altura, visível da ilha Norte da Nova Zelândia. “O ambiente não é seguro para que regressemos à ilha”, explicou o comissário da polícia neozelandesa, John Tims.
Sete helicópteros estiveram envolvidos nas operações de socorro, mas a polícia seguiu os conselhos dos cientistas e disse “não estar em posição de voltar à ilha durante a noite”. Ao nascer do dia, mal amanheceu, as operações recomeçaram. Segundo o jornal local New Zealand Herald, o governo tinha instalado em 2016 um abrigo na ilha vulcânica para o caso de haver uma erupção inesperada como a desta segunda-feira, mas não se sabe ainda se foi utilizado. A primeira-ministra deslocou-se à cidade mais perto da ilha, Whakatane, onde se reuniu com governantes locais; está previsto que visite a ilha esta terça-feira. “Posso assegurar-vos que a polícia está a fazer tudo o que pode”, referiu Jacinda Ardern.
Ilha era considerada “segura”
A ilha Branca fica a cerca de 50 quilómetros da costa Este da ilha Norte da Nova Zelândia e é propriedade privada. Apesar de ter um vulcão ativo, há turistas a visitar a ilha com frequência, havendo viagens diárias à cratera do vulcão.
A jornalista portuguesa Vera Alves trabalha desde 2017 no jornal New Zealand Herald e conta ao PÚBLICO que a ilha é considerada segura, “tanto quanto uma ilha com um vulcão ativo pode ser”. A jornalista explica que a cratera do vulcão é uma atração turística – ela própria já a visitou – e que ninguém esperava este desastre. “Neste momento são 22h [mais 13h do que em Portugal] e não sabemos a verdadeira dimensão, é impossível saber e contactar quem está na ilha”, refere. “Sabemos que há pessoas na ilha e estamos à espera do pior porque os cinco mortos fazem parte daqueles que foram retirados ”, conta. O turista norte-americano Michael Schade estava num barco a sair da ilha quando o vulcão entrou em erupção e contou à BBC que esteve “literalmente na beira da cratera principal” 30 minutos antes. “Ainda parecia seguro, mas estavam a tentar limitar o tamanho dos grupos”, contou à BBC. “Tínhamos acabado de entrar no barco quando alguém apontou e vimos. Fiquei chocado. O barco voltou para trás e apanhámos mais algumas pessoas que estavam à espera na doca”.
Também o turista brasileiro Allessandro Kauffmann contou no Instagram que houve duas visitas guiadas na segunda-feira: a dele foi a primeira, mas o segundo grupo não conseguiu sair a tempo. “Saímos cinco minutos antes de o vulcão entrar em erupção. Houve pessoas que saíram com o corpo queimado, estava tudo coberto por fumaça, por cinzas do vulcão, é inexplicável”.
Pensa-se que muitas das pessoas que estavam na ilha eram passageiros do cruzeiro Ovation of the Seas e que grande parte das vítimas seja de nacionalidade australiana. Contactada pelo PÚBLICO, a secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas diz não ter ainda informação sobre portugueses afetados pela erupção.
Há imagens de um helicóptero na ilha, coberto por cinzas, mas o seu tripulante e quatro passageiros não apresentam ferimentos e conseguiram regressar a terra de barco. “A [empresa turística] Volcanic Air confirmou que tinha um helicóptero na ilha na altura em que o vulcão entrou em erupção”, disse um porta-voz da empresa. “Cinco pessoas tinham voado para a ilha de helicóptero, mas conseguiram regressar de barco”, acrescentou.
Um “desastre à espera de acontecer”
O vulcanólogo português Carlos Rosa diz ao PÚBLICO que a Nova Zelândia “tem um centro de monitorização vulcânica muito bom, mas há uma imprevisibilidade muito grande associada aos vulcões” e que este, em concreto, tem “tendência para ter um magma mais explosivo do que os outros”. Os vulcões ativos podem ter erupções periódicas e a Nova Zelândia é particularmente suscetível a acontecimentos deste género por estar localizada no anel de fogo do Pacífico, uma área em forma de ferradura de cerca de 40 mil quilómetros de grande atividade geológica na bacia deste oceano.
Citados pelo jornal britânico The Guardian, os cientistas dizem que a ilha era “um desastre à espera de acontecer”. “Visitei o vulcão duas vezes e sempre senti que era demasiado perigoso para permitir visitas diárias”, explicou o académico Raymond Cas. “Não recomendaria certamente que os turistas se aproximassem de um sítio que tem expelido recentemente material até 30 metros de altura”, afirmou o geocientista Derek Wyman. “Normalmente as pessoas não morrem por causa destas erupções, mas talvez assim seja porque não estão descabidamente perto.”
A última erupção mortal deste vulcão aconteceu em 1914, quando morreram 12 mineiros. Houve outra erupção de curta duração em Abril de 2016, sem registo de vítimas. Segundo o instituto neozelandês de geociência GNS Science, não se prevê que haja agora um agravamento do estado do vulcão.
A erupção foi súbita e inesperada, mas não é incomum na ilha. “Erupções súbitas e inesperadas de vulcões como o da ilha Branca podem acontecer a qualquer altura”, explicou o vulcanólogo Shane Cronin, da Universidade de Auckland. Cerca de 70% do vulcão Whakaari – o seu nome na língua do povo maori – está debaixo de água, o que faz com que seja uma das maiores estruturas vulcânicas da Nova Zelândia. A ilha Branca tornou-se uma propriedade privada em 1953 e há visitas diárias que levam mais de 10 mil turistas por ano à ilha.